Geertz ( Islam Observed: Religious Development in Morocco and Indonesia, UCP 1968) defende a tese segundo a qual o confronto entre colonizador e colonizado foi sempre, em última análise, espiritual. Guardem a pistola anti-teorias pós-coloniais porque vai valer a pena. Geertz lembra que os principais monumentos erigidos pelos colonizadores não foram catedrais, teatros ou palácios, mas estradas, pontes, bancos e portos. As elites coloniais trabalharam ao lado do território existente, promovendo uma nova ordem, como é lógico. Só que essa nova ordem - a sociedade bifurcada como Geertz a designa - instaurou mais do que uma diferença de poder, estatuto ou situação. Instaurou uma diferença cultural. Por mais que os holandeses com a sua etische richting ou os franceses com a sua mission civilisatrice tenham tentado, o grupo original ( no trabalho de Geertz os muçulmanos de Marrocos e os de Java) manteve-se intacto. Geertz assinala, com humor, que os colonizados triunfaram: permaneceram exactamente como eram. Isto pode e deve ser aproveitado para os tempos de hoje. Talvez existam 20 milhões de muçulmanos na UE. Como a crença religiosa é anterior à experiência ( ao contrário da crença política, sexual ou outras), não é difícil imaginar que uma certa radicalidade cultural vai permanecer. Aliás, existem semelhanças com os anteriores espaços coloniais: os muçulmanos europeus sentem-se separados das elites residentes ( o cenário é que está de pernas para o ar), a crença religiosa, porque organizadora do quadro cultural, definindo e estendendo essa separação a cada tentativa de aproximação. A questão do estatuto da mulher ( de que falarei mais tarde) é um bom exemplo.
O problema, Filipe, é que no Islão a crença religiosa ("anterior à experiência") não é separável da "crença política sexual, etc" (que, "ao contrário", já seria posterior à experiência). Este é o eterno engano da nossa maneira de ver o Islão. Bom post. Vou ver se repondo.
Boa tarde FNV, Há que situar esse "anterior à experiência" e recoradr que o Islão é de 623. Curioso também seria analisar a colonização que o Islão fez de outra paragens ( Áfria sub-sariana e oriente ). Para Oriente é interessante ler os livros de N.S. Naipaul. Cumprimentos
Caros António e Pedro, Com "anterior à experiência" quero dizer que a crença religiosa não resulta da análise lógica, da observação empírica, da reflexão sobre a realidade etc. É nesse sentido.
Caro JPT, Espero poder desenvolver, mas a coisa passará por isto: se a diferença reside na crença religiosa a assimilação ( cultural) é um mito. Terão de ser encontradas alternativas.
Boa noite FNV Sendo a crença sempre "anterior", coisa sobre a qual estou de acordo a priori, e o Islão leva esse conceito quase ao limite, pois já se nasce muçulmano, há no entanto um outro problema que se coloca. O "posterior" não existe, nomeadamente a opção de recusar individualmente a religião recusando qualquer "análise lógica", "reflexão sobre a realidade" ou "observação empírica" resultante de um percurso livre e individual.
Outra questão prende-se com o mito que é (também concordo a priori)a assimilação cultural. Esta noção é mais querida do lado da Jihad do que do lado Cristão (para simplificar o argumento) que neste momento tenta encontrar um ponto de equilíbrio que não de assimilação, mas de "coabitação" e respeito mútuo. Naipul, como já foi referido, é uma excelente referência, para além de um belíssimo escritor. Joana
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